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domingo, 14 de março de 2010

Brasil pressiona os EUA no caso do algodão

Marcio Azevedo

Esta semana o governo brasileiro publicou no Diário Oficial a primeira lista de produtos dos Estados Unidos que sofrerão taxações extras para serem importados daqui para frente. Tal medida é chamada de retaliação cruzada e refere-se ao direito obtido pelo Brasil junto à OMC (Organização Mundial do Comércio) de obter vantagens em valores acima de US$ 800 milhões no comércio com os EUA.

Há oito anos o Brasil luta na OMC para derrubar os subsídios (auxílio governamental) que o governo estadunidense oferece aos seus produtores de algodão, causando uma perda de competitividade dos produtores de outros países. Somente agora o governo brasileiro obteve vitória final para retaliar os EUA, obrigando-os a vir para a mesa de negociações.

A OMC foi criada em 1994 durante a Conferência de Marrakesch, ao termo das complexas negociações da Rodada Uruguai. O surgimento da OMC veio coroar a montagem da arquitetura mundial da nova ordem internacional, que começara a ser delineada no fim da Segunda Guerra Mundial, com a criação do FMI e do Banco Mundial, todas instituições surgidas de Bretton Woods. As suas funções são: gerenciar os acordos que compõem o sistema multilateral de comércio; servir de fórum para comércio internacional (firmar acordos internacionais); e supervisionar a adoção dos acordos e implementação destes pelos membros da organização (verificar as políticas comerciais nacionais). Outra função muito importante da OMC é o Sistema de Resolução de Controvérsias, o que a destaca entre outras instituições internacionais. Este mecanismo foi criado para solucionar os conflitos gerados pela aplicação dos acordos sobre o comércio internacional entre os membros da OMC. As negociações na OMC são feitas em Rodadas; atualmente ocorre a Rodada de Doha iniciada em 2001. Como se pode perceber a organização tem bastante poder no que diz respeito às questões comerciais internacionais.

Como o Brasil saiu vitorioso no contencioso sobre o algodão com os Estados Unidos, a OMC autorizou o país a fazer a retaliação cruzada, ou seja, taxar bens e serviços além da quebra de propriedade intelectual (patentes). Isto dá ao país um poder de barganha extraordinário, pois ao escolher (como fez o Brasil) taxar produtos importantes de áreas poderosas da economia estadunidense (filmes, veículos, etc.), o Brasil faz com que estes setores se voltem contra o governo dos EUA e o pressionem para negociar. Assim o Brasil consegue aliados para sua luta dentro dos Estados Unidos. E isto mostra o quanto o governo brasileiro não tem interesse em retaliar de verdade os EUA. O que o governo brasileiro quer é obrigar aquele país a negociar, o que já está ocorrendo pois o governo americano imediatamente enviou um negociador ao Brasil após a divulgação da lista no Diário Oficial.

Interessante notar que foram os países desenvolvidos que propuseram este tipo de retaliação cruzada na OMC. Seria uma forma de pressionar os países emergentes. Na época os subdesenvolvidos se posicionaram contra a proposta, mas acabaram aceitando desde que os desenvolvidos se curvassem também às decisões da OMC neste quesito. Hoje, ironicamente, tal decisão se volta contra os mais ricos.

Lamentavelmente nossa grande mídia não se comportou como o esperado no que diz respeito à defesa dos interesses brasileiros, aliás, como sempre. Como o jornalista Luiz Nacif apontou em artigo no IG, foi o caso de O Globo e do Jornal Nacional que, em vez de divulgar a lógica da retaliação, preferiram matérias mostrando que o aumento das alíquotas de importação prejudicaria o consumidor brasileiro – mesmo sabendo-se que existem produtos de outras origens para substituir o norte-americano.

O jogo das negociações está totalmente em aberto, pois finalmente os EUA aceitaram conversar. Cada lado vai buscar o melhor acordo possível. Previsivelmente os EUA deverão aportar recursos para um fundo destinado ao setor algodoeiro do Brasil, até porque não é do interesse de nenhum dos dois países iniciarem uma guerra comercial. Ponto para o Brasil.

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