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sábado, 14 de novembro de 2009

CLIMA: Um perigo tão real quanto sua solução

Maurice Strong

O rápido e inesperado desastre econômico, que começou nos Estados Unidos e se estendeu por todo o mundo, demonstrou que a globalização e a interdependência têm o dramático inconveniente dos riscos compartilhados e da vulnerabilidade. Isso mostra que devemos manejar essas crises cooperativamente, sobre uma base sistêmica e integrada, em lugar de fazê-lo de forma separada e frequentemente de maneira competitiva.

Alguns, entretanto, ainda afirmam que podemos enfrentar os riscos da mudança climática e reparar os danos da degradação ambiental somente após termos acertado a economia global. Isto é insensatez. Esperar para empreender ações contra a mudança climática, enquanto se tenta remendar provisoriamente o atual modelo econômico, só faria exacerbar as iminentes ameaças contra nossa civilização.

Será decisivo o papel da China nas negociações que acontecerão em dezembro, em Copenhague, entre os signatários da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática. Nessa conferência mundial, deverão ser assumidos compromissos vinculantes e exigíveis, com punições para quem descumpri-los. Devemos aprender com os muitos acordos que os governos se comprometeram a cumprir no passado, mas que raramente honraram. Se tivessem cumprido essas obrigações não estaríamos no estado atual de crise.

China e Índia agora são as principais fontes de aumento nas emissões globais de gases causadores do efeito estufa, e estão sob forte pressão para que aceitem metas específicas. Estas e outras nações em desenvolvimento insistem, com toda razão, em uma redução maior das emissões nos países industrializados, que são os principais responsáveis pelo acúmulo desses gases que levaram o clima mundial ao perigoso umbral em que se encontra. Isso deve estar acompanhado de compromissos para proporcionar ajuda em grande escala às nações em desenvolvimento, para permitir que reduzam suas emissões sem prejudicar seu crescimento econômico.

Um cenário otimista para Copenhague incluiria um acordo sobre um programa de segurança climática ou, pelo menos, os principais elementos de um plano desse tipo, combinados com o estabelecimento de um fundo para a segurança climática. Os países mais desenvolvidos entregariam recursos para esse fundo de maneira proporcional às suas emissões de dióxido de carbono e ao seu produto interno bruto (PIB). O fundo deveria contar, inicialmente, com pelo menos US$ 1 trilhão, quantia bem além da que as nações industrializadas estão dispostas a considerar.

É provável que esse montante seja considerado pouco realista, particularmente à luz da crise econômica global. Porém, é inferior ao custo que representam, apenas para os Estados Unidos, as guerras no Iraque e no Afeganistão. Tal nível de financiamento para o fundo exige inovadores recursos, como pagamento pelo uso dos bens comuns globais, como os oceanos, a atmosfera e o espaço exterior, que não estão sob jurisdições nacionais, bem como a aplicação de impostos aos combustíveis fósseis e a outras fontes de emissões, além da imposição de penalidades por descumprimento dos objetivos de redução das emissões.

Uma ajuda em grande escala aos países em desenvolvimento, acompanhada por amplos programas que lhes permitam obter créditos por sua capacidade de reduzir emissões a um custo menor do que muitas nações desenvolvidas, oferece a possibilidade de investimentos eficazes e economicamente vantajosos. Os investimentos que fizermos para conseguir a segurança climática gerarão novas oportunidades, tanto para as empresas como para os indivíduos que participarem do estabelecimento da nova economia. Assim, em suas origens, como em suas soluções, as crises ambiental e econômica estão intrinsecamente vinculadas.

A moralidade de nossa civilização merece um triste comentário quando se comprova que são destinados mais recursos para as atividades militares do que para atender as necessidades humanitárias e sociais e para proteger a viabilidade de nosso planeta. China e Estados Unidos em conjunto produzem aproximadamente 40% das emissões globais de gases estufa. Embora todas as nações devam cooperar para enfrentar o desafio da mudança climática, será essencial a cooperação desses dois países.

A China ultrapassou os Estados Unidos como principal fonte de emissões de carbono, mas ainda está muito abaixo em termos de contaminação por pessoa. Cada chinês produz, em média, apenas um quinto das emissões de cada norte-americano. Desde o começo da revolução industrial, os Estados Unidos geraram mais de 1,1 trilhão de toneladas de dióxido de carbono pela queima de combustíveis fósseis, enquanto a China produziu 300 bilhões de toneladas.

Somos a primeira geração na história que tem a capacidade e a responsabilidade de determinar o futuro da vida na Terra. Não podemos ser complacentes e acreditar que, façamos o que fizermos, a vida continuará. As condições que tornam possível a existência tal como a conhecemos permaneceram em um breve período da história de nosso planeta e dentro de limites muito estreitos. Resulta evidente que os seres humanos estão incidindo sobre esses limites a uma velocidade e uma escala que vão além de nossa capacidade de regulá-los. A humanidade está diante de um risco real e iminente. Por outro lado, as perspectivas de êxito para enfrentá-lo, apesar de desafiadoras, também são muito reais.

* Maurice Strong (http://www.mauricestrong.net/) foi secretário-geral da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano em 1972 e o primeiro diretor-geral do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.

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